Salário está cada vez mais curto

Ao longo dos anos, o poder de compra do consumidor que aufere o salário mínimo tem vindo a decrescer e não há nenhum registo de que, em algum momento, este cobriu, ao menos, a metade das necessidades de alimentação.

Ao longo dos anos, o poder de compra do consumidor que aufere o salário mínimo tem vindo a decrescer e não há nenhum registo de que, em algum momento, este cobriu, ao menos, a metade das necessidades de alimentação.

Mesmo com os reajustes anuais, o aumento não tem efeito significativo no orçamento doméstico. A cesta básica é tida como o conjunto de produtos básicos para o sustento de um agregado familiar composto por cinco pessoas durante um mês.

O cabaz, composto por arroz, farinha de milho, óleo vegetal, açúcar, amendoim, feijão manteiga, peixe, sabão, hortofrutículas e pão, foi desenhado em 1987 para servir de base de fixação do primeiro salário mínimo.

Volvidos vários anos, continua sendo usado para fundamentar um maior aumento daquele salário. Seis mil meticais era o mínimo exigido, para este ano, por vários sindicatos dos trabalhadores moçambicanos filiados na Organização dos Trabalhadores Moçambicanos - Central Sindical (OTM-CS).

Mas, como sempre, o valor final do salário mínimo aprovado pelo Governo está muito abaixo da proposta dos sindicatos variando entre 1.680 e 3.500 meticais. O sector financeiro foi o que maior aumento observou, em termos percentuais, na ordem de 26,9%, ou seja, os profissionais deste sector passarão a auferir 3.500 meticais contra os 2.758 praticados em 2009. Os números de produtos do cabaz mantém- se, ao passo que o salário mínimo nacional, desde que foi instituído, já sofreu várias alterações e mesmo assim nunca chegou a cobrir 50% dos custos da cesta básica.

Por outras palavras, apesar de reajustes positivos anuais, o salário mínimo está aquém de satisfazer as necessidades elementares de alimentação do cidadão comum, pois o poder de compra do consumidor tem vindo a decrescer como consequência do “sistema de fixação, do valor base do salário mínimo e do fraco poder negocial dos sindicatos”, explica a economista Ercília Nhampossa. “A queda do poder de compra está também associada a uma desproporcionalidade entre o crescimento do salário mínimo e o crescimento do nível geral de preços dos produtos que compõem a cesta básica”.

“Além da cesta básica, os trabalhadores têm outras necessidades com a saúde, o vestuário, a educação, a água e a energia”, afirmou Nhampossa, tendo acrescentado que para fazer face à situação os cidadãos optam pelo comércio informal. Na opinião daquela académica, o salário mínimo nacional deve cobrir aquelas despesas de modo que o trabalhador tenha condições de contribuir para o progresso do país. “Uma melhor solução não passa só pelo ajuste do salário mínimo, mas sim pela criação de um mecanismo que permita que a economia esteja acessível ao consumidor”, disse.

Não dá para viver só com salário mínimo

Não há registo de melhor ano para o consumidor moçambicano no que se refere à cobertura do salário mínimo em relação à alimentação básica, desde a sua introdução em 1987, no âmbito das reformas económicas que o país vinha sofrendo, e até aos dias de hoje. A proporção actual do salário que acaba de entrar em vigor é quatro vezes mais baixo do que o custo de uma cesta básica necessária para um agregado familiar de cinco pessoas viver com alguma dignidade.

Face a esta situação, alguns indivíduos buscam alternativas para sustentar a família. Herculano Guilamba, trabalhador no sector de construção, aufere um salário mínimo de 2.250 meticais por mês e afirma que, em nenhum momento, aquele montante cobriu as suas despesas básicas, nomeadamente a alimentação, a renda de casa e o transporte. Para Herculano, o novo reajuste de salário, que lhe garante o montante mensal de 2.552 meticais, não vai melhorar a sua situação financeira, pois continuará a contrair dívidas para sobreviver. “Mesmo com esse aumento vou continuar a fazer dívidas e xitique para sustentar a minha família”, disse acrescentando que, fazendo as contas, por dia gasta mais do que ganha com o transporte, de casa para o posto de trabalho e vice-versa, e alimentação.

Tal como Herculano, Rafique Mapamo, funcionário público, que ganha mensalmente 2.250 meticais, opta pela prática de xitique para atender a algumas necessidades vitais suas e dos membros da sua família. “Este valor é muito pouco, só dá para pagar a renda e alimentação”, comentou referindo que à medida em que os salários são reajustados os preços dos produtos não param de subir.

Silvestre Nabhala, que trabalha como segurança auferindo 2 mil meticais, conta que daquele valor retira 1.500 e entrega à sua esposa para fazer negócios de modo a ajudar nas despesas de casa e no sustento dos seus sete filhos. “É difícil viver com este salário e nem chega para comprar comida”, desabafa.

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